Querido leitor, hoje começo com uma narrativa e termino com uma conclusão nada feliz.
Sou leitor de "Veja" desde os onze anos de idade. Como tenho 33, logo se conclui que passei 2/3 da minha vida lendo a tal revista. Meu pai a apresentou. Agradeço a ele, e muito! De fato, por muitos anos, a "Veja" foi um bom referencial cultural e educacional. Como a maioria dos brasileiros, de certa forma - e aqui faço uma paráfrase a um amigo meu - fui educado também pela mídia. Graças à editora Abril aperfeiçoei meus conhecimentos de português e idéias.
No entanto, a gente cresce... e amadurece! E algumas coisas, com o tempo, não nos servem mais. Ou porque mudamos ou porque aquilo que nos prestava fica obsoleto ou, talvez, as duas coisas... Infelizmente, no caso de "Veja", percebo que não fui eu que mudei radicalmente ou fiquei "oldfashioned"... De fato, numa visão nua e crua, Veja ficou velha demais para o Brasil e (perigosa) para a democracia!
Já vem de longa data esse processo de esclerose! Mas ultimamente tem atingido proporções insustentáveis... E nem me refiro às sucessivas reportagens (de capa), às vésperas de outubro, fazendo alusão a "polvos" e "lulas" e "Dilmas" - todos, segundo o periódico, animais com muitos tentáculos... rs... Quero apenas protestar, neste texto, contra uma apologia ao nazismo, feita na última edição da revista, mais precisamente na reportagem da página 90, Ciganos de volta ao lar, da edição de 22.09.2010.
O subtítulo da matéria em referência, que passo a transcrever: Sarkozy acelera a política de devolver à Bulgária e à Romênia os cidadãos exportados para esses países não é o mais grave, embora, devamos ressaltar, caro leitor, que pessoas jamais podem ser exportadas, visto que apenas coisas o são! Mas sim sua conclusão, sem, claro, mencionar os entrementes. No final da página, chega-se à ideia genial: A hipocrisia da discussão impede que se enxergue que Bulgária e Romênia, valendo-se do fato de serem países-membros da União Européia, colocam passaportes comunitários nas mãos de ciganos e proativamente exportam (olha o verbo de coisificação do ser humano aí de novo!!!) principalmente, para França e Itália - cujos habitantes e seus políticos ficam, então, com a pecha de xenófobos.
Pois é: para variar, a matéria é tendenciosa! Tenta-se mitigar a polêmica ferrenha discutida na Europa, em grande parte contrária à "exportação de gente". Nem poderia ser diferente: os ciganos, sejam eles romenos, búlgaros ou - em muitos casos, franceses ou italianos - são cidadãos da União Européia e, em assim sendo, podem viver, dentro do território da União Européia, no lugar que quiserem, do jeito que bem entenderem! São pessoas dotadas de dignidade humana - Sarkozy, lembra-se de Kant?! - e não coisas, objetos e meios de determinados fins políticos execráveis. Apoiar tal atitude seria o mesmo que reviver o nazismo quando, naqueles trágicos tempos, vários ciganos, juntamente com judeus e homossexuais, foram exterminados, exatamente por serem destituídos de suas respectivas dignidades em decorrência de um sistema político insidioso, baseado na desinformação da população e da neurose coletiva que dela se originou.
Enfim: Veja, apoiando deslavadamente essa atitude do governo francês, sinceramente, para mim, passou longe de qualquer limite de lucidez! Vivemos uma época de cerceamento de liberdades, como já disse aqui. No entanto, por mais paradoxal que seja, essa limitação vem da imprensa, da "grande mídia", que fica mais e mais sensacionalista à medida em que perde leitores e deixa de exercer seu fim: informar para a democracia! Não apoio nazistas, nem Lenis Riefenstahls. Jamais serei conivente com tamanha barbaridade e covardia! Por isso, numa triste (e feliz) conclusão: deixo de ler a Veja, após 22 anos. Tchau, sem saudades pra você!
PS: meu pai deixou de ler o periódico acima há muito mais tempo. Parabéns, pai!
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Alê, não posso comentar sobre a matéria especificamente pois, confesso, passei batido. Mas falando de um modo geral, cada vez mais tenho refletido sobre a influência da mídia na vida das pessoas. Tudo se dá por meio dela, que a meu ver nunca é imparcial. Expressa ou implicitamente, sempre há alguma tendência. E não acho que isso seja um grande problema por si só. O perigo, na verdade, está na carência de instrução e em alguns casos educação também, para que as pessoas usem do seu senso crítico e possam assim filtrar o que estão lendo, assistindo ou ouvindo. A uns meses atrás, de acordo com as notícias veiculadas, diríamos que o nosso país era um dos melhores para se viver. E, vamos combinar, independentemente do governo que nos representa ou representou, nunca estivemos proximos disso. Enfim... lamento tambem que as coisas sejam dessa forma e que, muitas pessoas sejam manipuladas, ainda que de forma inconsciente. Um beijo, Mari.
ResponderExcluirPS: Sobre a Veja em si, e agora um comentário mais leve, você notou a quantidade de páginas de propagandas? A edição dessa semana deve ser 70% dedicada à publicidade.